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Lula e a grande luta contra o fake news da gastança, por Luís Nassif
Para 2024, o pagamento de juros da dívida pública está previsto em R$ 740 bilhões, ou 6,9% do PIB.
18/06/2024 13h09
Por: Redação Fonte: PT na Câmara
A palavra gastança, em referência ao governo Lula, é repetida por 10 entre 10 jornalistas medíocres, opina Nassif Foto: Ricardo Stuckert

O editorial da Folha fala em “impulso gastador irresponsável do governo Luiz Inácio Lula da Silva (PT)”. Não ouse perguntar onde está esse “impulso irresponsável”. O editorialista não saberá dizer. E, se disser, terá que mencionar os benefícios concedidos ao setor com a desoneração da folha, a isenção de ICMS aos exportadores agrícolas e de commodities, às jogadas da Ambev com o chá de Guaraná da Zona Franca, a engenharia fiscal desproporcional de grandes grupos. A palavra gastança é repetida por 10 entre 10 jornalistas medíocres, que apontam saúde e educação como escoadouros de desperdício.

Aliás, em um caso raro, há uma belíssima reportagem de Mateus Coutinho e Felipe Coutinho, na UOL, mostrando a hipocrisia dos críticos da gastança.

– a Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil criticou a gastança, mas com isenções de R$ 59,7 bilhões.

– o setor de combustíveis critica a gastança e recebeu incentivos de R$ 31,1 bilhões

Na Educação, há infraestrutura precária no ensino médio, falta de recursos para as universidades e falta de materiais didáticos. Fornecer o básico é gastança?

Há falta de recursos para transporte público, saneamento básico, assistência social. A maioria dos professores da rede pública federal não têm reajuste desde 2019; os servidores do INSS estão com os salários congelados desde 2017.

Onde está a gastança? O orçamento total das Universidades Federais para 2024 está em R$ 6,2 bilhões. Indague desses gênios do senso comum onde está a gastança e ninguém conseguirá identificar.

Para 2024, o pagamento de juros da dívida pública está previsto em R$ 740 bilhões, ou 6,9% do PIB. Em 2023, com a Selic média em 13,25%, os juros da dívida pública chegaram a R$ 729,9 bilhões. Se a Selic estivesse em 7%, os juros teriam sido de R$ 597,7 bilhões, redução de R$ 132,2 bilhões em relação ao que foi pago.

Para efeito de comparação, em 2024 o orçamento previsto é de:

R$ 231,3 bilhões para Saúde;

de R$ 82,9 bilhões para Educação;

de R$ 106,1 bilhões para Infraestrutura.

Só esse diferencial de juros equivale a 7 vezes o que é pago para todas as universidades federais.

Aí vem os idiotas da objetividade alegar que os juros são altos porque o risco de inflação é alta ou há ameaça de déficit público, a tal da gastança. E ainda soltam matérias enormes denunciando as fakenews das redes sociais.

Analise a taxa básica de juros, a inflação e o resultado nominal das contas públicas nas principais economias europeias e compare com as brasileiras.

País Taxa básica de juros Inflação (últimos 12 meses) Resultado nominal das contas públicas (% do PIB)
Alemanha 0,00% 7,90% -2,30%
França 0,25% 5,80% -1,70%
Itália 1,00% 6,00% -7,20%
Espanha 1,25% 8,70% -5,40%
Holanda 0,50% 9,60% -1,10%
Portugal 1,00% 9,20% -3,00%
Grécia 0,75% 9,10% -7,50%
Bélgica 0,50% 8,60% -2,80%
Áustria 0,00% 8,20% -1,90%
Finlândia 0,50% 5,20% -1,50%

Não apenas isso. Compare as taxas de juros internas do crédito pessoal com as da França, por exemplo:

Taxas médias: No Brasil, a taxa média do crédito pessoal em dezembro de 2022 era de 30,1% ao ano, enquanto na França era de 3,9% ao ano em maio de 2024.

Compare as taxas médias de outros países com a inflação anual:

País Taxa média anual de juros (%) Inflação anual (%)
França 3,9 5,8
Suíça 4,5 2,5
Luxemburgo 4,7 5,1
Finlândia 4,9 2,3
Holanda 5,1 8,8
Alemanha 5,3 7,9
Irlanda 5,7 5,9
Portugal 5,9 9,2
Bélgica 6,1 10,5
Áustria 6,3 8,2

Ou, então, o custo da dívida pública.

País Títulos Taxa de juros (Ano)
Alemanha Bund (10 anos) 2,12%
França OAT (10 anos) 1,78%
Itália BTP (10 anos) 3,83%
Espanha Bono (10 anos) 2,67%
Portugal OT (10 anos) 3,12%
Holanda State Bond (10 anos) 1,87%
Bélgica OLO (10 anos) 2,25%
Grécia Greek Government Bond (10 anos) 4,15%
Irlanda 10-Year Government Bond 1,98%
Áustria AT10Y (10 anos) 2,31%

E aqui, os títulos brasileiros:

Títulos Prefixados:

Tesouro Prefixado 2025 (TPRE 25): 5,85% ao ano

Tesouro Prefixado 2026 (TPRE 26): 6,20% ao ano

Tesouro Prefixado 2027 (TPRE 27): 6,45% ao ano

Tesouro Prefixado 2030 (TPRE 30): 6,70% ao ano

Títulos Pós-Fixados:

Tesouro Selic 2025 (TSEL 25): + 1,15% ao ano + Selic

Tesouro Selic 2026 (TSEL 26): + 1,20% ao ano + Selic

Tesouro Selic 2027 (TSEL 27): + 1,25% ao ano + Selic

Tesouro Selic 2030 (TSEL 30): + 1,30% ao ano + Selic

Títulos IPCA:

Tesouro IPCA+ 2029 (TIPR 29): + 5,76% ao ano + IPCA

Tesouro IPCA+ 2035 (TIPR 35): + 5,50% ao ano + IPCA

Segundo os estudos do professor Ladislau Dowbor, 82% do estoque da dívida de R$ 7 trilhões são resultado da dinâmica de juros sobre juros, não da gastança. Não apenas isso. Segundo seus cálculos, a taxa média de juros para pessoas jurídicas está entre 21% e 23% ao ano, o que significa 3% do PIB drenado para os financistas. Outros 10% são representados pelos juros das famílias; 6% são de evasão fiscal e 6% de renúncias fiscais; e o crédito rotativo está entre 86% e 100% ao ano. É um dinheiro esterilizado, que serve apenas para acumulação – muitas vezes de capitais externos – não volta para a produção na forma de investimentos.

O dinamismo da economia reside na capacidade do setor privado – famílias e empresas – de poupar para consumir ou investir. Todo esse potencial, que poderia gerar um mercado de consumo robusto, é drenado para os juros e, atrás deles, para os fundos de investimento, muitos deles no exterior. E esses recursos não revertem em novos negócios, novas empresas, novos empregos.

E vem os idiotas da objetividade falar em gastança.

Ontem, Lula fez a mais relevante afirmação de princípios de seu governo: não se buscará o equilíbrio fiscal sacrificando os mais fracos, retirando a vinculação da Saúde e da Economia.

Falta, agora, a montagem da estratégia de resistência, que passa pelo investimento gerencial pesado nas frentes de desenvolvimento que se apresentam ao país: de industrialização e transição energética, além de programas voltados para o fortalecimento da pequena e micro empresa e da inovação.

O grande salto do país passa pela transição da poupança rentista para o investimento financeiro – , entendido o investimento em atividades produtivas. Faz-se isso de suas maneiras:

1- Baixando vigorosamente a taxa Selic, hoje em dia nas mãos de um grupo sabotador, em um caso inédito de presidente de Banco Central candidatando-se a Ministro de um governo de oposição e tendo conta offshore;

2- montagem dos planos de industrialização para abrir espaço para que os recursos financeiros troquem o rentismo pelos investimentos reais.

E grupos de trabalho não significam apenas conselhos consultivos vagos, mas técnicos e representantes da sociedade civil elaborando cronogramas, definindo funções, prazos e metas.

Publicado no site GGN