São Paulo — O casal que escravizou uma mulher por 30 anos deve pagar pouco mais de R$ 7 mil após condenação. A dupla foi sentenciada a 2 anos de prisão em regime aberto, além de 10 dias-multa, totalizando R$ 506 para cada.
Os condenados, José Enildo Alves de Oliveira e Maria Sidronia Chaves de Oliveira, são donos de uma loja no Brás, na região central de São Paulo. A mulher foi submetida a trabalho análogo à escravidão no estabelecimento e também na casa do casal.
A pena restritiva de liberdade, no entanto, pode ser substituída pelo pagamento de quatro salários mínimos, sendo dois para cada um, totalizando R$ 6.072, além da prestação de serviços à comunidade. Somando as multas e o pagamento dos salários, o total chega a R$ 7.084.
A pena para esse tipo de crime é de reclusão, de 2 a 8 anos, e multa, além da pena correspondente à violência.
A decisão foi proferida pelos desembargadores André Nekatschalow e Mauricio Kato, Ali Mazloum e pela juíza Luciana Ortiz, da 5ª turma do Tribunal Regional Federal da 3ª região (TRF-3).
Em primeiro grau, a juíza Paula Mantovani Avelino absolveu o casal, em agosto do ano passado. O Ministério Público Federal (MPF) recorreu, levando o julgamento para a 5ª turma.
Em 2014, denúncia foi feita ao Ministério Público do Trabalho (MPT), que assinou Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) com os denunciados. O acordo previa a regularização da situação da vítima. Além disso, o casal deveria dar um imóvel à mulher. Contudo, o acordo não foi cumprido.
A vítima procurou o Núcleo de Proteção Jurídico Social e Apoio Psicológico (NPJ) da Mooca, do Centro De Referência Especializado de Assistência Social (Creas), em abril de 2022. Ela solicitou vaga para acolhimento e relatou o descumprimento do acordo.
No mês seguinte, em maio de 2022, já com vaga de acolhimento disponível, os agentes do NJP compareceram à residência e constataram que o casal estava tentando impedir a saída da empregada. Eles alegaram que ela havia mudado de ideia sobre a denúncia.
Em setembro de 2023, o MPF apresentou denúncia à Justiça. Em março do ano passado, foi realizada a primeira audiência. O órgão ratificou a autoria do casal e a prática de crimes, pedindo a condenação dos réus.
A defesa, por sua vez, afirmou que as questões trabalhistas devem ser separadas das questões criminais. O primeiro âmbito já havia sido julgado, “com condenações pertinentes”. No âmbito criminal, o casal alegou que não houve crime na relação entre os empregadores e a mulher.
A juíza Paula Mantovani Avelino, da 9ª Vara Federal Criminal de São Paulo, decidiu em agosto do ano passado pela absolvição do casal. A magistrada alegou que não haveria provas de que a mulher foi submetida, de fato, a situação análoga à escravidão.
Baseou a decisão da juíza o fato de a vítima ter livre acesso à residência, podendo entrar e sair quando quisesse. “Assim, caso estivesse sendo submetida a trabalhos forçados, jornadas exaustivas e/ou qualquer tipo de condição degradante, poderia, na primeira oportunidade que saísse da casa, pedir auxílio em qualquer um daqueles lugares que frequentava”, considerou a magistrada.
Mantovani considerou ainda que demorou para a mulher realizar a primeira denúncia, o que aconteceu apenas em 2014, cerca de 20 anos depois de começar a trabalhar para o casal. Além disso, na ocasião, a vítima relatou ter vínculo afetivo com a família – ponto que também pesou para a decisão da magistrada
O MPF recorreu da absolvição. E, por unanimidade, a 5ª Turma aceitou parcialmente o recurso, condenando o casal a 2 anos de reclusão em regime aberto, substituíveis pelos quatro salários mínimos (dois para cada) e prestação de serviços à comunidade.
Ainda cabe recurso. Questionado, o MPF afirmou que “não adianta possíveis manifestações processuais”.
A vítima foi levada para um abrigo em 27 de julho de 2022. O Metrópoles não localizou a defesa do casal.
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