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A Amazônia Legal acaba de ganhar um centro inédito dedicado à recuperação de ecossistemas desmatados e degradados. Coordenado pela Embrapa, o Centro Avançado em Pesquisas Socioecológicas para a Recuperação Ambiental da Amazônia, batizado de Capoeira, reúne mais de 100 pesquisadores de 33 instituições do Brasil e do exterior, entre universidades, órgãos governamentais, ONGs, empresas privadas e coletivos locais. O projeto foi aprovado pelo Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) no âmbito do edital Centros Avançados em Áreas Estratégicas para o Desenvolvimento Sustentável da Região Amazônica, o Pró-Amazônia, e contará com investimento de R$ 14 milhões.
O Capoeira terá um hub na sede da Embrapa Amazônia Oriental, em Belém (PA), e deve atuar de forma virtual integrando instituições, laboratórios e grupos de pesquisa em estudos socioeconômicos, ecológicos e bioculturais na região. “Atualmente, há grupos de pesquisa, redes colaborativas e comunidades locais empenhados na recuperação dos ecossistemas amazônicos. A proposta do Capoeira é ir além da produção de ciência de excelência, buscamos também articular e promover uma transformação positiva na região, substituindo a cultura da destruição pela da restauração”, pontua Joice Ferreira, pesquisadora da Embrapa e coordenadora do centro.
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Os pesquisadores vão analisar dados de mais de 100 sítios de estudo em diferentes estados da Amazônia Legal. As áreas correspondem a iniciativas de restauração em locais com florestas secundárias, florestas primárias degradadas, áreas com Sistemas Agroflorestais e restauração de sistemas aquáticos.
Nesses locais, serão avaliados estoques ou incremento de carbono, recuperação da biodiversidade, resultantes do tipo de restauração aplicado. As iniciativas de restauração podem envolver regeneração natural da vegetação; regeneração natural assistida (quando se enriquece a área com plantios de espécies nativas e outras práticas de manejo); e regeneração por meio de plantio total ou semeadura direta, quando a cobertura do solo já é praticamente inexistente.
Outra estratégia são os Sistemas Agroflorestais (SAFs), que buscam o aumento de árvores nas paisagens, inclusive nas áreas agrícolas, e conciliam as necessidades ecológicas e as demandas econômicas dos agricultores familiares e povos da floresta. Os SAFs, segundo estudos pontuais do grupo da pesquisadora, são as estratégias de recuperação mais estudadas na região (37,88%), seguida pela regeneração natural (30,35%) e plantios florestais (19,55%).
“A maioria desses estudos são pontuais e existem lacunas de conhecimento sobre a restauração em importantes aspectos, como as questões socioeconômicas e culturais. O Centro surge, portanto, como uma iniciativa que visa desenvolver estudos mais integrativos, abordando diferentes aspectos da restauração, sejam eles ecológicos, sociais, culturais, econômicos e outros”, explica Ferreira.
O Capoeira será também um polo de informações sobre cenários e riscos frente às mudanças climáticas, com a produção de mapas de ocorrência e recorrência de extremos de secas, temperaturas e mudanças climáticas, além de identificação de espécies de plantas e polinizadores mais resilientes.
Foto: Ronaldo Rosa (SAF_ sistema agroflorestal)
Diferença entre restauração e recuperaçãoA restauração ecológica é o processo de apoiar a recuperação dos ecossistemas visando retornar ao seu estado original, incluindo as espécies nativas e as funções ecológicas, com o objetivo de resiliência de longo prazo. A recuperação, por sua vez, visa retornar as funções e processos ecossistêmicos, mesmo que a composição de espécies e a estrutura sejam diferentes da original. |
Uma das principais estratégias de atuação do Centro será a criação de “laboratórios vivos” (living labs), que serão espaços de trocas de experiências e conhecimentos baseados no conceito de inovação aberta, nos quais as comunidades locais e pesquisadores conhecem, avaliam e validam experiências de restauração de forma coletiva.
Os laboratórios estão localizados em três territórios amazônicos: 1. região de Santarém, no Oeste do Pará, com destaque para a Floresta Nacional (Flona) do Tapajós, a Reserva Extrativista (Resex) Tapajós-Arapiuns e assentamentos rurais; 2. mosaico do Gurupi, região formada por Unidades de Conservação (UCs) e Terras Indígenas no Pará e Maranhão; e 3. Nordeste Paraense, abrangendo municípios como Bragança, Capitão Poço, Irituia, Paragominas e Tomé-Açu, região de colonização mais antiga do estado.
Esses territórios são considerados importantes espaços de pesquisa e ação devido às intensas transformações socioambientais que ocorreram em suas paisagens ao longo de diferentes períodos, de acordo com os pesquisadores do Centro. “Neles já existem parcerias de longa duração com as comunidades locais, e serão espaços de escuta e co-construção, com foco em ações de recuperação florestal com abordagem biocultural”, acrescenta a pesquisadora Ima Vieira, do Museu Paraense Emílio Goeldi e integrante do Capoeira.
Foto: Ronaldo Rosa (área degradada)
A restauração dos ecossistemas amazônicos é considerada urgente, para os cientistas do Capoeira. Apesar dos esforços e compromissos assumidos pelo poder público local, nacional e internacional, iniciativa privada e cooperação da sociedade civil, a restauração dos ecossistemas precisa ganhar escala e integrar a diversidade de atores envolvidos no tema, afirma o grupo.
Para Danielle Celentano, do Instituto Socioambiental (ISA) e integrante do Centro, “a restauração de ecossistemas deve garantir diversidade e inclusão, integrando conhecimento tradicional, ciência e tecnologia — só assim construiremos soluções justas e duradouras".
O Brasil assumiu o compromisso no Acordo de Paris de recuperar 12 milhões de hectares até 2030, dos quais cerca de 38% devem ocorrer na Amazônia. Essa meta está associada a compromissos internacionais que serão amplamente debatidos durante a Conferência das Nações Unidades sobre as Mudanças Climáticas 2025, que ocorrerá em novembro deste ano, em Belém, capital do Pará.
Os pesquisadores do Capoeira acreditam que a restauração florestal é uma estratégia fundamental para mitigar as mudanças climáticas e certamente será um tema de debate importante na COP 30 entre os países em desenvolvimento. “A maior parte das emissões brasileiras advém dos desmatamentos na Amazônia e mudanças de uso da terra, logo ações que revertam os efeitos dos desmatamentos são fundamentais”, afirma Joice Ferreira.
Cenário da restauraçãoUm levantamento realizado pela Aliança pela Restauração, consórcio de instituições públicas e privadas, em 2020, foram identificadas 2.773 iniciativas de restauração de paisagens florestais na Amazônia brasileira, somando 113,5 mil hectares. O maior número de iniciativas na região corresponde a Sistemas Agroflorestais (SAFs) totalizando 1.643 (59%), seguido pelo plantio de mudas com 734 iniciativas (26%). A maioria das iniciativas (79%), segundo o levantamento, são de pequena escala (áreas menores que 5 hectares). Ferreira ressalta ainda que instrumentos como a Política Nacional de Recuperação da Vegetação Nativa (Proveg), a Comissão Nacional (Conaveg) e o Plano Nacional de Recuperação da Vegetação Nativa (Planaveg) e, no nível estadual, o Plano Regional de Recuperação da Vegetação Nativa (PRVN), são importantes para articular e promover ações de recuperação, “mas é preciso um esforço conjunto entre sociedade e poder público para dar escala à restauração”, finaliza. |
Instituições envolvidasO Capoeira é coordenado pela Embrapa Amazônia Oriental e tem a colaboração das outras Unidades da Embrapa - Roraima, Agricultura Digital e Recursos Genéticos e Biotecnologia- e das Universidades Federais dos estados do Amapá; Maranhão; Roraima; Acre; Mato Grosso; Rural da Amazônia, do Pará, do Oeste do Pará, e do Sul e Sudeste do Pará; além das instituições: Instituto de Desenvolvimento Florestal e da Biodiversidade (Ideflor-Bio), Instituto Federal do Mato Grosso (IFMT), Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia (Ipam), Instituto Socioambiental (ISA), Instituto Tecnológico Vale (ITV), Museu Paraense Emílio Goeldi (MPEG), e The Nature Conservancy (TNC-parceira).] O Centro avançado conta também com o trabalho de pesquisadores e técnicos do Centro Nacional de Monitoramento e Alertas de Desastres Naturais (Cemaden), Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz (Esalq/USP), Universidade Federal de Lavras (UFLA), Universidade Federal de Uberlândia (UFU), Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), Universidade Federal do Pernambuco (UFPE) e Mombak - parceira. A nível internacional, também são instituições colaboradoras o Centro de Cooperação Internacional em Pesquisa Agrícola para o Desenvolvimento (Cirad) - na França; Universidade Imperial de Londres, Universidade de Lancaster, Universidade Metropolitana de Manchester, Universidade de Oxford - no Reino Unido; e Centro de Pesquisa Climática - nos Estados Unidos. |
Ana Laura Lima (MTb 1.268/PA)
Embrapa Amazônia Oriental
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