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Cientistas propõem observatório global unificado para monitorar biodiversidade do solo

A intenção do Glosob é identificar pontos críticos de biodiversidade do solo e áreas de monitoramento chave, garantindo uma coleta de dados mais representativa e estratégica

Por: Redação Fonte: Embrapa
23/07/2025 às 13h23
Cientistas propõem observatório global unificado para monitorar biodiversidade do solo
Foto: Cíntia Niva
  • Brasil lidera proposta para criação de observatório global da biodiversidade do solo.
  • Iniciativa pretende padronizar indicadores, unificar bancos de dados e apoiar políticas públicas ambientais.
  • O solo abriga 59% da biodiversidade mundial, mas é pouco monitorado.
  • Embrapa é protagonista com cientistas de quatro unidades.
  • Proposta foi aprovada em reunião da FAO e pode ser lançada na Conferência das Nações Unidas sobre Biodiversidade, em 2026.

 

Pesquisadores da Embrapa, em parceria com a Organização das Nações Unidas para Alimentação e Agricultura (FAO/ONU) e outras instituições internacionais, propõem a criação de um observatório global da biodiversidade do solo, o Glosob (Global Soil Biodiversity Observatory). A proposta, publicada nesta semana na revista Nature Ecology and Evolution, pretende estabelecer um sistema unificado e padronizado de monitoramento da biodiversidade do solo - elemento essencial para a vida no planeta e que abriga 59% da biodiversidade mundial, mas ainda pouco observado e altamente vulnerável às mudanças climáticas e ao mau uso da terra (leia o artigo aqui).

A intenção é padronizar indicadores e aprimorar as capacidades nacionais de monitoramento da biodiversidade do solo, de modo a apoiar a formulação de políticas baseadas em evidências, facilitando avaliações globais. O pesquisador George Brown, da Embrapa Florestas (PR), explica que, atualmente, há dois indicadores nas convenções internacionais que abordam os solos: um índice de agrobiodiversidade e outro de mudanças nos estoques de carbono orgânico do solo. “Eles não consideram a biodiversidade do solo nem as interações biológicas que regulam os ciclos biogeoquímicos e outras funções ecossistêmicas essenciais para a vida na terra”, declara o cientista.

A intenção do Glosob é identificar pontos críticos de biodiversidade do solo e áreas de monitoramento chave, garantindo uma coleta de dados mais representativa e estratégica. Para isso, pretende priorizar os esforços de capacitação, de modo que todos os países, independentemente de seus recursos técnicos e financeiros, possam contribuir. “Hoje, nem todos têm capacidade para monitorar os organismos do solo, e diversas análises globais revelam que muitas regiões permanecem subestimadas”, aponta a pesquisadora Maria Elizabeth Correia, da Embrapa Agrobiologia (RJ), que também assina o artigo no periódico.

Foto: Cintia Niva (centopeia_Chilopoda)

Os cinco eixos de atuação do Glosob

A estruturação do Glosob, segundo os cientistas, deve estar apoiada em cinco pilares: padronização dos métodos para medir os indicadores da biodiversidade do solo; integração da biodiversidade em levantamentos convencionais do solo e sistemas nacionais de informação do solo; aumento no apoio financeiro, institucional e de capacitação aos países; conscientização sobre o papel e o valor dos organismos do solo e suas funções para a prestação de serviços ecossistêmicos; e melhora na interação sobre biodiversidade e indicadores, com informações sobre melhores práticas e modelos econômicos e estruturas políticas e legais projetadas para proteger e restaurar o ecossistema solo.

Além de padronizar os indicadores e variáveis, o monitoramento da biodiversidade do solo a partir do Glosob deve permitir análises e avaliações mais acuradas sobre a situação desses ecossistemas em todo o mundo, permitindo a construção de mapas globais de distribuição da biodiversidade e de um banco de dados unificado. “A partir desse observatório será possível identificar melhores práticas para a conservação do solo e uso de sua biodiversidade, bem como das suas contribuições para os serviços ecossistêmicos. Além disso, poderá ser um importante incentivo ao desenvolvimento de políticas públicas que abordem a saúde do solo, também garantindo que essa permaneça uma prioridade na governança ambiental global”, acredita Correia.

Outro diferencial da proposta é a abordagem colaborativa, envolvendo povos indígenas e o conhecimento tradicional, formuladores de políticas públicas, produtores agrícolas e especialistas técnicos. As iniciativas nacionais deverão ser acompanhadas por um comitê diretor de especialistas, de modo a avaliar realidades específicas de cada local. “Os esforços de capacitação, as salvaguardas legais e o alinhamento com os compromissos nacionais e internacionais aumentarão o engajamento, enquanto a colaboração contínua por meio de conselhos consultivos, plataformas digitais e gerenciamento adaptativo garantirá o sucesso a longo prazo”, escrevem os autores.

Próximos passos

A proposta do Glosob foi aprovada em 2024, durante a 12ª reunião do Global Soil Partnership da FAO, da qual participaram mais de 900 pessoas de 143 instituições parceiras. “Com a publicação do artigo na Nature, a divulgação será muito mais ampla, alcançando muitos atores nos âmbitos científico e político. Espera-se que isso provoque um efeito cascata de discussão sobre a importância da avaliação e do monitoramento da biodiversidade nos solos mundiais, e que os países signatários da Convenção da Biodiversidade (CBD) e participantes da reunião se organizem para colocar em prática a implementação do Glosob local e regionalmente”, aponta Brown.

Segundo ele, a expectativa é que na próxima Conferência das Nações Unidas sobre Biodiversidade (COP 17), a ser realizada em 2026, todos os países já apresentem uma proposta de como irão implementar as decisões relacionadas à iniciativa da biodiversidade do solo, incluindo o Glosob. O plano de ação para a efetiva implementação da iniciativa envolve quatro etapas, com finalização prevista até 2030.

Foto: Cntia Niva (microminhoca_Enchytraeida_sobre gramínea)

 

Para a pesquisadora Cintia Carla Niva, da Embrapa Suínos e Aves (SC), a Embrapa pode ser importante aliada no estabelecimento e escolha de locais para a implementação do monitoramento do Glosob no Brasil. “Nosso país se destaca entre os de clima tropical com expertise em biodiversidade do solo, e vários dos cientistas especialistas são da Embrapa”, argumenta. Brown concorda: “O know-how da Empresa na avaliação e monitoramento da biodiversidade do solo será importante para fomentar a capacitação necessária para a implementação do Observatório, não apenas localmente, mas também em nível internacional.”

 

Biodiversidade e mudanças climáticas

Um dos resultados da Conferência das Nações Unidas sobre Biodiversidade (COP15), realizada em 2022 em Montreal, no Canadá, foi a implementação do Marco Global de Biodiversidade Kunming-Montreal, cujo objetivo é enfrentar a perda da biodiversidade, restaurar ecossistemas e proteger os direitos indígenas. 

A intenção é deter e reverter a perda natural, colocando 30% do planeta e 30% dos ecossistemas degradados sob proteção até 2030. Relatório da Plataforma Intergovernamental sobre Biodiversidade e Serviços Ecossistêmicos (IPBES), órgão independente apoiado pela ONU, estima que um milhão de espécies vegetais e animais estejam sob risco de extinção. E o ritmo da extinção das espécies está cada vez mais acelerado: segundo a organização WWF, na publicação Planeta Vivo 2024, o tamanho médio das populações de mais de 5 mil espécies monitoradas foi reduzido em 73% nos últimos 50 anos.

A biodiversidade do solo é apenas um dos ecossistemas afetados, e é extremamente sensível ao cenário atual de mudanças climáticas (variações de temperatura e padrões de precipitação) e degradação ambiental, muitas vezes em consequência de práticas agrícolas insustentáveis, desmatamento, espécies invasoras, poluição, entre outras causas. “A grande preocupação é que essa biodiversidade fornece serviços ecossistêmicos vitais para os seres humanos, como produção de alimentos, água limpa, armazenamento e ciclagem de materiais, energia e nutrientes”, afirma Niva.

Segundo os cientistas, o monitoramento padronizado da biodiversidade do solo nos países por meio do Observatório Global da Biodiversidade do Solo (Glosob) permitirá a identificação das melhores práticas para a conservação e o uso sustentável dessa biodiversidade.

 

Foto: Cíntia Niva (tatu-mamífero)

 

Esforço internacional

Ao todo, 29 cientistas de nove países se uniram em um esforço conjunto para elaborar a proposta do Observatório Global da Biodiversidade do Solo. Essa foi uma demanda dos signatários da Convenção da Biodiversidade (CBD), a partir da COP15 de 2022. Na ocasião, como parte do Plano de Ação 2020-2030 da Iniciativa Internacional para a Conservação e Uso Sustentável da Biodiversidade do Solo, a Organização das Nações Unidas para Alimentação e Agricultura (FAO/ONU) foi convidada a estabelecer um observatório para identificar indicadores padrão para o monitoramento da biodiversidade do solo e fortalecer sua operacionalização nos países.

Participaram da construção do artigo Combining science and policy for a unified global soil biodiversity observatory pesquisadores, analistas e bolsistas de quatro Unidades da Embrapa. São eles: George Gardner Brown, Lucília Maria Parron Vargas e Talita Ferreira (Embrapa Florestas); Maria Elizabeth Fernandes Correia, Ederson Conceição JesusMárcia Reed CoelhoGuilherme Montandon Chaer e Luiz Fernando de Souza Antunes (Embrapa Agrobiologia); Ieda MendesJuaci Malaquias e Maria Inês Oliveira (Embrapa Cerrados); Cintia Carla Niva (Embrapa Suínos e Aves); e Ozanival Dario Silva (hoje chefe da Assessoria de Auditoria Interna, então da Embrapa Cerrados).

Também são autores da publicação membros das seguintes instituições: FAO/ONU, Universidade de Wageningen (Holanda), Universidade de Coimbra (Portugal), European Comission - Joint Research Center (Itália), Universidade Federal do Paraná (Brasil), Western University (Canadá), Instituto de Tecnologia do Norte de Alberta (Canadá), Universidad de La Salle (Colômbia), Universidade de Lérida (Espanha), Universidade do Estado do Colorado (Estados Unidos), Universidade de Bolonha (Itália), Convenção da Diversidade Biológica (Canadá) e Secretaria de Agricultura e Desenvolvimento Rural (México).

 

Foto: Cintia Nova (fungo e coprolito)

 

Objetivos de Desenvolvimento Sustentável da ONU

A implementação do Glosob, o desenvolvimento de políticas e a adoção de práticas de conservação da biodiversidade do solo estão em consonância com os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável da ONU (ODS), particularmente os objetivos 2 (Fome Zero), 3 (Boa saúde e Bem-estar), 6 (Água limpa e Saneamento), 13 (Ação climática) e 15 (Vida na Terra). 

A iniciativa também atende aos objetivos da Década da Restauração de Ecossistemas, instituída pela ONU para os anos de 2021-2030. Com liderança do Programa da ONU para o Meio Ambiente (PNUMA) e da Organização das Nações Unidas para Alimentação e Agricultura (FAO/ONU), a Década tem como objetivo inspirar e apoiar governos, organizações multilaterais, sociedade civil, empresas do setor privado, jovens, grupos de mulheres, povos indígenas, agricultores, comunidades locais e indivíduos em todo o mundo para colaborar, desenvolver e catalisar iniciativas de restauração em nível global. 

 

Acesse o artigo aqui.

 

 
 

Liliane Bello (MTb 01.766/GO)
Embrapa Agrobiologia

Contatos para a imprensa

Telefone: (21)3441-1596

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