O presidente Luiz Inácio Lula da Silva afirmou, nesta terça-feira (19), que a agenda de desenvolvimento sustentável da Organização das Nações Unidas (ONU) pode se tornar o maior fracasso da entidade. Ao abrir o debate geral de chefes de Estado da 78ª Assembleia Geral das Nações Unidas (ONU), em Nova York, Lula disse que a desigualdade é o principal desafio da humanidade e, para superá-la, “a fome, a pobreza, a guerra, o desrespeito ao ser humano” precisam inspirar indignação nos líderes políticos.
Lula defendeu uma reforma no sistema de governança global e disse que a comunidade internacional está mergulhada “em um turbilhão de crises múltiplas e simultâneas”. O presidente citou a pandemia da covid-19, a crise climática e as inseguranças alimentar e energética, que, segundo ele, são ampliadas por “crescentes tensões geopolíticas”.
“Se tivéssemos que resumir em uma única palavra esses desafios, ela seria desigualdade. A desigualdade está na raiz desses fenômenos ou atua para agravá-los. A mais ampla e mais ambiciosa ação coletiva da ONU voltada para o desenvolvimento, a Agenda 2030, pode se transformar no seu maior fracasso. Estamos na metade do período de implementação e ainda distantes das metas definidas. A maior parte dos objetivos de desenvolvimento sustentável caminha em ritmo lento”, disse Lula.
“O imperativo moral e político de erradicar a pobreza e acabar com a fome parece estar anestesiado. Nesses 7 anos que nos restam, a redução das desigualdades dentro dos países e entre eles deveria se tornar o objetivo síntese da Agenda 2030”, acrescentou o presidente.
“Somente movidos pela força da indignação poderemos agir com vontade e determinação para vencer a desigualdade e transformar efetivamente o mundo a nosso redor. A ONU precisa cumprir seu papel de construtora de um mundo mais justo, solidário e fraterno. Mas só o fará se seus membros tiverem a coragem de proclamar sua indignação com a desigualdade e trabalhar incansavelmente para superá-la”, disse o brasileiro aos líderes mundiais.
De acordo com o presidente, o Brasil quer “dar sua devida contribuição ao enfrentamento dos principais desafios globais”. Ele citou programas e ações implementados pelo governo brasileiro, como o Brasil sem Fome, o Bolsa Família, a taxação de super-ricos, a lei da igualdade salarial entre homens e mulheres, o combate ao feminicídio e defesa de direitos de grupos LGBTQI+ e pessoas com deficiência.
Lula afirmou ainda que o Brasil está comprometido com a implementação de todos os 17 objetivos de desenvolvimento sustentável, “de maneira integrada e indivisível”, e que quer alcançar a igualdade racial na sociedade brasileira, como um décimo oitavo objetivo “que adotaremos voluntariamente”.
O combate às mudanças climáticas também foi destaque no discurso do brasileiro. Lula cobrou que os países ricos cumpram os compromissos assumidos no âmbito internacional, como a doação de US$ 100 bilhões ao ano para que países em desenvolvimento preservem suas florestas. Para o presidente, a destinação desses recursos permanece “apenas uma longa promessa”.
“Hoje esse valor seria insuficiente para uma demanda que já chega à casa dos trilhões de dólares”, destacou.
Segundo Lula, os países ricos cresceram baseados em um modelo com altas taxas de emissões de gases danosos ao clima. E afirmou que as nações em desenvolvimento não querem repeti-lo, e que agir contra a mudança do clima implica enfrentar desigualdades históricas.
“A emergência climática torna urgente uma correção de rumos e a implementação do que já foi acordado. Não é por outra razão que falamos em responsabilidades comuns, mas diferenciadas. São as populações vulneráveis do Sul Global as mais afetadas pelas perdas e danos causados pela mudança do clima. Os 10% mais ricos da população mundial são responsáveis por quase a metade de todo o carbono lançado na atmosfera”, disse.
Ao citar as potencialidades das energias limpas, ele acrescentou que um modelo de desenvolvimento “socialmente justo e ambientalmente sustentável” é possível. Lula falou sobre a realização da Cúpula da Amazônia, em agosto, em Belém, e lembrou que os países da região lançaram uma agenda de colaboração comum, que engloba o combate ao desmatamento e a inclusão produtiva dos povos da região, e que tem como base a soberania sobre os territórios.
Este ano, o tema do debate geral da Assembleia Geral da ONU é Reconstruir a confiança e reacender a solidariedade global: acelerando ações para a Agenda 2030 e seus Objetivos de Desenvolvimento Sustentável rumo à paz, prosperidade, ao progresso e à sustentabilidade para todos. Nesta sessão de trabalho, os chefes dos Estados-membros da ONU são convidados a discursar em uma oportunidade para apontar suas visões e preocupações diante do sistema multilateral.
Cabe ao governo brasileiro fazer o primeiro discurso da Assembleia das Nações Unidas, seguido do presidente dos Estados Unidos. Essa tradição vem desde os princípios da organização, no fim dos anos 1940.
Esta é a oitava vez que o presidente Lula abre o debate geral dos chefes de Estado. Ao longo de seus dois mandatos anteriores, ele participou do evento todos os anos entre 2003 e 2009. Em 2010, foi representado pelo então ministro das Relações Exteriores e atual assessor especial da Presidência Celso Amorim.
O presidente desembarcou em Nova York na noite de sábado (16), onde participou de reuniões com empresários e autoridades estrangeiras. Nesta quarta-feira (20), ele se encontrará com o presidente da Ucrânia, Volodimir Zelensky. Ainda nesta quarta-feira, Lula será recebido pelo presidente dos Estados Unidos, Joe Biden, com quem lançará uma iniciativa global para promoção do trabalho decente.
Edição: Fernando Fraga
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