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Uma imagem registrada em 2023, em Frutal (MG), impressionou pesquisadores e produtores de abacaxi. Ao lado de uma plantação praticamente dizimada pela fusariose, vicejava uma área com frutos intactos, sem sinal de alguma doença. Nela, estavam as variedades BRS Sol Bahia e BRS Diamante , produzidas pela Embrapa e que chegam agora aos abacaxicultores de todo o País. Além da resistência à principal doença do abacaxi, as novas cultivares apresentam alto potencial produtivo, frutos mais firmes e resistentes e excelente sabor.
Causada pelo fungo Fusarium guttiforme , a fusariose é responsável por prejuízos expressivos à produção nacional, chegando a inviabilizar trabalhos inteiros. A doença compromete o desenvolvimento da planta, impede o uso de mudas das plantas doentes em novos plantios e impossibilita o consumo de frutos afetados. A resistência genética dos novos materiais, portanto, representa uma vantagem valiosa ao produtor, reduzindo com controle químico e ampliando a sustentabilidade da cultura.
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O fato de os frutos serem produzidos sem o tratamento com fungicidas traz maior segurança alimentar para o consumidor. O produtor também ganha ao economizar esses insumos e, principalmente, ao evitar perdas provocadas pela fusariose que atingem, em média, 20% das plantas, mas pode chegar até a perda total da área de produção.
Além da resistência a essa doença — enquanto os principais abacaxis plantados no Brasil (Pérola, Smooth Cayenne ou Havaiano e Turiaçu) são suscetíveis —, as novas variedades têm várias outras vantagens. Elas são adaptadas aos principais produtos regionais de abacaxi do País. Produzem frutos com elevado teor de açúcar e acidez média, o que conferem sabor excelente. Apresentam poucos espinhos nas folhas, facilitando os tratos culturais. Seus frutos demonstraram maior firmeza e resistência durante o transporte e maior vida de prateleira.
"Nossos materiais possuem um conjunto de características que tornam os produtos superiores, sendo a principal delas a resistência à fusariose. E é resistência total, diferente de tolerância", ressalta o pesquisador da Embrapa Mandioca e Fruticultura (BA) Davi Junghans , líder do programa de melhoramento genético do abacaxi. Ele explica que, no caso de uma doença foliar, como a Sigatoka da bananeira, a produção é reduzida, mas o produtor ainda pode colher alguma coisa. Já no caso da fusariose do abacaxi, o fruto perde totalmente o valor de mercado. "A fusariose tem a capacidade de eliminar uma plantação inteira! Nosso parceiro Júlio Leonel chegou quase à perda total de seu plantio de Pérola em 2023. Essas novas variedades, que focam no mercado do Pérola, vêm atender à principal demanda para a sustentabilidade da abacaxicultura brasileira", conta o cientista.
Ele destaca também a maior produtividade dos materiais, que gira em torno de 56 toneladas por hectare, bem acima da produtividade média do abacaxi no Brasil, de aproximadamente 26 toneladas por hectare (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística – IBGE , 2024). "Isso se dá com razão porque a Pérola tem muita perda em função da fusariose. A tendência, então, é que os novos materiais sejam bem mais produtivos", ressalta Junghans.
Fotos: Davi Junghans (frutos do abacaxi Pérola com fusariose)
Os experimentos em Frutal surgiram em 2018, com o plantio de cinco genótipos, três da Embrapa e as cultivares Pérola e Smooth Cayenne como testemunhas. O terceiro planejamento, colhido em 2023, envolveu 900 plantas e foi um sucesso, em contraponto à produção comercial do Pérola: 95% das 300 mil plantas da labora convencional foram atacadas pela fusariose na época.
“Foi um desastre nas plantações de abacaxi, enquanto nenhuma das plantas do experimento da Embrapa teve problema com a doença”, lembra o vice-presidente da Cooperativa dos Produtores Rurais de Aparecida de Minas ( Coopercisco ), Júlio Cesar Leonel. “Do Pérola, hoje, eu tenho um pouco. Geralmente planto 300 mil plantas por ano, mas, como tive aquele prejuízo enorme, só cinco condições de plantar 90 mil. Tenho mais 90 mil do Havaiano e aumentei o número com as variedades da Embrapa para 5 mil plantas”, contou o agricultor.
As duas cultivares apresentam frutos de tamanho semelhante ao do Pérola — a média do BRS Sol Bahia é 1,37 kg, e do BRS Diamante, 1,67 kg —, polpa creme, elevado teor de açúcares e média acidez, além de poucos espinhos. "Essa é uma grande vantagem para o manejo da cultura, pois não prejudica o trabalhador. No caso do Pérola, o pessoal faz uma poda para poder entrar na plantação, retirando área foliar, o que também prejudica a planta", afirma o pesquisador da Epamig Daniel Angelucci, que atuou na avaliação das variedades, ao lado do pesquisador da Embrapa Tullio Pádua .
Os frutos de ambos os materiais devem ser colhidos com uma cascata colorida. "O abacaxi é um fruto não climático, o que significa que não melhorou significativamente após a colheita. São quatro pontos de colheita: verde, pintado, colorido e amarelo. 50% a 75% amarela”, explica Junghans.
De acordo com Angelucci, um dos grandes desafios em relação aos materiais é fazer com que o mercado entenda essa diferença. “O consumidor acaba associando o amarelo com o abacaxi passado. E, na verdade, esses materiais precisam ser coletados coloridos, caso contrário o fruto fica ácido. Por isso, temos que intensificar o trabalho de divulgação dessas variedades, que são uma grande evolução. A questão da resistência é excepcional. Além de economizar muito recurso no cultivo, além de pulverizações com fungicidas”, elogia o profissional da Epamig.
No caso do BRS Sol Bahia ( foto à direita ), a maturação do fruto é cerca de duas semanas mais tardias em relação à Pérola, e do BRS Diamante, aproximadamente 30 dias, recurso interessante para ampliar a janela de marketing.
Análises sensoriais foram realizadas no Laboratório de Ciência e Tecnologia de Alimentos da Embrapa Mandioca e Fruticultura. Os resultados indicaram que os frutos do BRS Sol Bahia e do BRS Diamante tiveram níveis elevados e acessíveis.
O coordenador técnico estadual de fruticultura da Emater-MG, Deny Sanábio, ressalta como uma das principais características das variedades, além da resistência à fusariose, a capacidade de produção de mudas do tipo filhote — o abacaxi tem quatro tipos de mudas: coroa, filhote (na base do fruto), rebentão (sai do solo, na base da planta-mãe) e filhote-rebentão (originado na axila de uma folha). "Isso porque a cultura do abacaxi exige a produção de grande quantidade de mudas. Para formar um hectare, por exemplo, são necessárias 35 mil unidades", diz Sanábio.
Foto: Davi Junghans (BRS Sol Bahia)
As mudas das duas variedades são produzidas por micropropagação em biofábricas e devem ser manejadas como plantas-matrizes. As mudas convencionais (filhotes e rebentões) obtidas a partir dessas matrizes devem ser utilizadas para o plantio em áreas maiores. Em uma estratégia análoga à Rede Reniva (Rede de multiplicação e transferência de material propagativo de mandioca com qualidade genética e fitossanitária), a Embrapa institui a Rede Ananás, que envolve os chamados “taleiros”, agentes produtores e multiplicadores de mudas de abacaxi em larga escala, utilizando a técnica de seccionamento de talo.
“A Rede Ananás trabalha organizando essa cadeia de produtores de material de plantio para que o abacaxicultor tenha acesso constante a material de qualidade superior para plantio”, pontua o engenheiro-agrônomo da área de transferência de tecnologia da Embrapa Herminio Rocha , coordenador da Rede Ananás.
Onde encontrar mudasNesse momento, biofábricas e taleiros são licenciados para produzir mudas do BRS Sol Bahia e do BRS Diamante seguindo protocolos definidos pela Embrapa. Eles concorreram a um edital de oferta pública e foram classificados (no lançamento já havia cinco licenciados). Responsáveis por implantar jardins clonais de mudas, cada empresa recebeu um lote com explantes (porções de tecido vegetal capazes de reproduzir uma planta sob condições controladas e artificiais) das variedades, para que possam estabelecer a produção em larga escala. “É importante que o produtor adquira mudas dos licenciados para ter a garantia de origem genética e sanidade dos materiais”, enfatiza Rocha. |
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Alessandra Vale (MTb 21.215/RJ)
Embrapa Mandioca e Fruticultura
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