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Falta de clareza do conceito de bioeconomia pode ser prejudicial à Amazônia

A bioeconomia é pensada ou tratada de acordo com as necessidades ou visões de cada país ou região

16/07/2024 às 10h24
Por: Redação Fonte: Embrapa
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Foto: Ronaldo Rosa
Foto: Ronaldo Rosa
  • O trabalho publicado na Ecological Economics mostra que a falta de uma definição do termo bioeconomia pode ser prejudicial à Amazônia e à sua população.
  • O grupo de pesquisadores discutiu os termos e conceitos em uso e avaliou o impacto deles na tomada de decisões em torno das políticas públicas para o desenvolvimento e conservação da Amazônia.
  • Equipe aponta que a bioeconomia é interpretada de acordo com as necessidades de cada segmento social e com as visões de cada país; por isso, recomendamos a formação de um consenso a respeito de princípios e definições associadas ao termo.
  • Os cientistas defendem que, na Amazônia, o termo “bioeconomia” deve estar associado ao compromisso com o desmatamento zero, equidade social e valorização das culturas locais e da biodiversidade.

Biotecnologia, biorrecursos, biomassa, biogás, biocombustíveis, agregação de valor a produtos da biodiversidade, economia ecológica… São muitos os termos, conceitos, produtos e processos que envolvem o que a comunidade científica vem chamando atualmente de Bioeconomia. É essa amplitude do termo, ou falta de clareza, que pode colocar em risco a sustentabilidade dos ecossistemas e das populações amazônicas, segundo trabalho publicado na revista internacional Ecological Economics.

Assinado por pesquisadores brasileiros e estrangeiros, que atuam na Amazônia, o trabalho A falta de clareza sobre o conceito de bioeconomia pode ser prejudicial aos ecossistemas amazônicos e seus povos (Uma falta de clareza a respeito do conceito bioeconomia pode ser prejudicial aos ecossistemas amazônicos e à sua população população) afirma que a bioeconomia é um termo amplo com diferentes significados e que pode se adequar a diferentes agendas científicas, políticas e mercadológicas. “A bioeconomia hoje pode incluir muitas coisas, desde as monoculturas como soja e dendê, até a extração e agregação de valor a produtos não-madeireiros. O que buscamos é chamar a atenção para a necessidade de esclarecer melhor esse termo e de organizar princípios fortes que considerem os povos amazônicos e a manutenção da floresta saudável, para que as estratégias de investimentos e políticas sejam direcionadas a um desenvolvimento justo para a região”, declara a pesquisadora Joice Ferreira , da Embrapa Amazônia Oriental , primeira autora do artigo.

Para os países da Amazônia e sua diversidade de contextos regionais, o trabalho aponta o termo “sociobioeconomia” como uma das abordagens mais adequadas. “O termo se refere à economia da floresta e à sua sociobiodiversidade, a combinação da diversidade biológica e cultural. A sociobioeconomia ainda considera a diversidade biocultural – a interação entre sistemas naturais e culturas humanas – e as economias indígenas, tradicionais e locais baseadas na sociobiodiversidade da região”, afirma o cientista. A utilização do termo, entretanto, deve estar pautada em princípios rigorosos, como o compromisso com o desmatamento zero, a equidade social e a valorização das culturas locais e da biodiversidade, sinalizando o artigo.

A Amazônia é a região mais biodiversa do mundo, abriga a maior floresta tropical do planeta, que é o centro de regulação do clima global, e tem uma população de cerca de 30 milhões de pessoas apenas na parte brasileira do bioma. A região abriga 59% do território brasileiro, 70% de todas as áreas continentais protegidas e 83% de todas as terras indígenas do Brasil.

 

Sociobiodiversidade

Conceito que expressa a inter-relação entre a diversidade biológica e a diversidade de sistemas socioculturais. É a combinação entre todos os organismos vivos na natureza, as pessoas, a cultura e as tradições.

 

Diferentes conceitos e narrativas

O grupo de pesquisadores discute os termos e conceitos em uso e avalia o impacto deles na tomada de decisão em torno das políticas públicas para o desenvolvimento da Amazônia. A trajetória do conceito envolve três visões, de acordo com a literatura científica: a bioeconomia biotecnológica, focada em tecnologias intensivas em ciência para aumentar a eficiência ambiental; a bioeconomia de biorrecursos, que propõe o aumento de produtividade e intensificação do uso do solo; e a bioeconomia voltada aos processos ecológicos que promovem a biodiversidade, entre outras questões.

Para a Organização das Nações Unidas para a Alimentação e Agricultura ( FAO ), por exemplo, bioeconomia é “Produção, utilização, conservação e regeneração de recursos biológicos – incluindo conhecimento relacionado, ciência, tecnologia e inovação – para fornecer soluções sustentáveis ​​(informações, produtos , processos e serviços) em todas as áreas econômicas, possibilitando a transformação para uma economia sustentável”. Já para a Comissão Europeia, bioeconomia é termo “relacionado a todos os setores de produção primária que utilizam e produzem recursos biológicos (agricultura, silvicultura, pesca e aquicultura) e a todos os setores econômicos e industriais que utilizam recursos e processos biológicos para produzir alimentos, rações, produtos de base biológica, energia e serviços”.

A bioeconomia, portanto, como atesta a pesquisadora, é pensada ou tratada de acordo com as necessidades de cada segmento social e com as especificidades de cada país ou região. “Alcançar consenso sobre termos e princípios fundamentais não é apenas uma questão de semântica. Novos campos de atuação trazem novas visões e narrativas que disputam recursos, investimentos e políticas públicas. Dessa forma, as narrativas dominantes têm o poder de definir futuras estratégias de desenvolvimento para a Amazônia”, afirma Ferreira.

Sociobioeconomia para a Amazônia

Pelo fato do termo ser ambíguo e pouco claro, a bioeconomia, dependendo da sua abordagem, também pode causar impactos negativos ao meio ambiente. Os pesquisadores apontam o exemplo da produção do fruto do açaí ( Euterpe oleracea Mart. ), que é o produto da bioeconomia mais promissor da Amazônia e o primeiro a ultrapassar um valor de mercado de US$ 1 bilhão, em 2023, segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Geografia e Estatística (IBGE).

“Ao mesmo tempo que a produção do fruto pode promover a conservação e o empoderamento local quando manejado de forma adequada, a rápida expansão do mercado tem levado à superexploração das florestas de várzea no estuário amazônico e à densidade da biodiversidade”, aponta a pesquisadora Ima Vieira, do Museu Paraense Emílio Goeldi, que também assina o artigo. 

“A expansão das atividades de bioeconomia tem, portanto, o potencial de alterar a Amazônia. A garantia de resultados positivos para as pessoas e a natureza dependerá de salvaguardas rigorosas. Em primeiro lugar, as definições e os princípios que sustentam a bioeconomia que trazem benefícios para a sociedade e o ambiente devem ser estágios”, afirma a cientista.

Para o pesquisador da Embrapa, Roberto Porro, que também assina a análise, o termo bioeconomia deve ser qualificado, e dar lugar ao conceito alternativo de sociobioeconomia. “Esta [a sociobioeconomia] leva em consideração a posição expressa por povos e comunidades tradicionais, que são os protagonistas da economia da floresta, enfatizando a geração de valor a partir de produtos da sociobiodiversidade e agrobiodiversidade amazônica”, reforça o cientista.

Porro acrescenta que as múltiplas expressões da sociobioeconomia amazônica constituem uma abordagem em bioeconomia inclusiva por meio do qual a Embrapa busca reposicionar sua atuação na região. Os pilares dessa abordagem integram sistemas produtivos sustentáveis, valorização do conhecimento e modos de vida locais, segurança alimentar, equidade e repartição de benefícios e redução da pobreza.

“O conceito de sociobioeconomia pode promover sistemas econômicos alternativos, em contraste com uma abordagem mercadológica tradicional, uma vez que está conciliando as relações harmoniosas entre as comunidades indígenas, locais e tradicionais e o seu ambiente”, apontando o artigo. Mas os autores defendem que o termo esteja embasado nos valores de justiça, ética, inclusão social, conservação da biodiversidade, equilíbrio climático e conhecimento tradicional.

 

Autores e instituições envolvidas no trabalho

A falta de clareza sobre o conceito de bioeconomia pode ser prejudicial aos ecossistemas amazônicos e seus povos é assinado por Joice Ferreira e Roberto Porro (Embrapa Amazônia Oriental), Emilie Coudel e Marie-Gabrielle Piketty (Centre de coopération internationale en recherche agronomique pour le développement, CIRAD, França), Ricardo Abramovay (Universidade de São Paulo), Jos Barlow (Lancaster Environment Centre, Lancaster University, Reino Unido), Rachael Garrett (Cambridge University, Reino Unido), Alexander C. Lees (Manchester Metropolitan University, Reino Unido), Ima Vieira (Museu Paraense Emílio Goeldi, Belém, Brasil) e Kieran Withey (Universidade Federal de Pernambuco).

Foto: Ronaldo Rosa

 

 
 

Ana Laura Lima (MTb 1.268/PA)
Embrapa Amazônia Oriental

perguntas da imprensa

Número de telefone: (91) 99110-5115

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