O presidente Lula reuniu-se nesta quinta-feira, 31 de outubro, no Palácio do Planalto, com governadores, vice-governadores, ministros e representantes do poder judiciário e do poder legislativo, de prefeituras e municípios, além da Polícia Federal e Polícia Rodoviária Federal, para discutir a questão da Segurança Pública no Brasil.
Na ocasião, foi apresentada a PEC da Segurança Pública, documento proposto pelo Ministério da Justiça e Segurança Pública (MJSP), que pretende conferir status constitucional ao Sistema Único de Segurança Pública (Susp), instituído em 2018, por lei ordinária.
“A questão da segurança pública hoje não é uma questão como já foi em outras décadas. O crime organizado hoje não é mais o bandido comum que a gente estava habituado a lidar. Hoje é uma organização poderosa que está envolvida em todos os setores da sociedade, inclusive em nível internacional”, ressaltou Lula.
Para o presidente, é premente a necessidade de um amplo pacto para que seja possível um combate efetivo ao crime organizado. “Essa é uma coisa que é quase que incontrolável se a gente não montar um pacto federativo que envolva todos os poderes da Federação, todos os poderes que estão envolvidos diretamente nisso, e que a gente possa construir um processo que discuta desde o sistema prisional até o sistema do cadastro que cada estado tem. É preciso que haja uma informação sistematizada, organizada, porque a gente não pode continuar permitindo que um criminoso no Paraná possa se esconder indo para São Paulo e tirando outra identidade ou ele comece um crime em São Paulo e vá se esconder em um estado do Nordeste”, pontuou Lula.
“Nós estamos dispostos a discutir quantas horas forem necessárias, quantas reuniões forem necessárias, para que a gente possa apresentar uma proposta definitiva de combate ao chamado crime organizado que está hoje espalhado em todo o território nacional”, prosseguiu o presidente.
“A apresentação dessa PEC é o começo de uma grande discussão que a gente quer fazer sobre segurança pública nesse país, sobre a criação de um sistema único de segurança pública. A gente não poderia mandar a PEC para o Congresso Nacional antes da gente fazer uma conversa com os governadores. E não apenas os governadores, mas a Suprema Corte, o Superior Tribunal de Justiça, a Secretaria-Geral da Presidência da República, o Ministério Público Federal, o Conselho Nacional do Ministério Público, ou seja, todas as instituições que, direta ou indiretamente, têm alguma coisa a ver”, frisou o presidente Lula.
ORGANIZAÇÕES MAFIOSAS – Para o ministro Rui Costa, da Casa Civil, ou o poder público, estados e municípios se organizam para responder ao avanço do crime organizado, ou os grupos que operam no país tendem a se tornar verdadeiras organizações mafiosas. “Hoje nós estamos falando de uma organização criminosa que ganha contornos rápidos de organização mafiosa no Brasil. Eles não só estão no crime, mas estão migrando para a economia real. Estão dando cursos de formação para concursos de polícia militar, cursos de polícia civil, estão participando no financiamento das campanhas eleitorais, enfim, estão sendo tomados contornos de organização mafiosa no Brasil”, alertou Rui Costa.
METODOLOGIA SUPERADA – O ministro da Justiça, Ricardo Lewandowski, detalhou em sua apresentação o que levou o Governo Federal, por meio de sua pasta, a propor a PEC da Segurança Pública. “O que nos levou a apresentar essa proposta é a constatação que depois de 36 anos de promulgação da Constituição Federal de 1988 a natureza da criminalidade mudou radicalmente. Este mecanismo, esta metodologia, esta institucionalidade que foi gestada pelos constituintes de 1988 está absolutamente superada pela dinâmica da criminalidade. A criminalidade mudou radicalmente. Ela não é mais local, ela é nacional. E, mais do que isso, na verdade ela é até transnacional. É uma criminalidade que se organizou para além dos estados-nação e hoje atua com muita desenvoltura no plano internacional”, afirmou Lewandowski.
“Chegou o momento de abrir o pacote e tornar público aquilo que estamos preparando que diz respeito às mudanças estruturais que pensamos fazer no tocante à segurança pública brasileira. Para isso, é preciso repensar o Pacto Federativo”, ressaltou o ministro da Justiça.
ARMAS E LAVAGEM DE DINHEIRO – Governador do Rio de Janeiro, Cláudio Castro destacou dois pontos que precisam ser atacados no combate à criminalidade no Brasil: a lavagem de dinheiro e o controle ao acesso às armas. “Só este ano nós apreendemos 550 fuzis no território do Rio de Janeiro. No meu mandato são dois mil fuzis, cinco mil armas, e esse ano 55 toneladas de drogas. E 90% das armas apreendidas pela polícia militar e pela polícia civil do estado do Rio de Janeiro foram fabricadas nos Estados Unidos. Foram vendidas para Paraguai, Colômbia e, se não me engano, Equador ou Venezuela. Nós sabemos de onde essas armas vêm. Sabemos para onde elas são vendidas. E, nesses países, elas perdem o monitoramento. A partir daí, ninguém sabe para onde essas armas vão”, revelou o governador.
Sobre a lavagem de dinheiro, Cláudio Castro afirmou que é preciso que o Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf) atue no sentido de identificar as empresas com movimentações fora do comum. “Se nós temos uma empresa que teve um custo de um milhão e lucrou 30 milhões, 40 milhões, eu não conheço a atividade econômica que dá esse valor. Essa empresa certamente está lavando dinheiro para alguém. E o Coaf tem toda a condição de saber que empresas estão tendo lucros excessivos. É bem provável que sejam empresas de fachada lavando dinheiro. Esse é o mecanismo que só o Governo Federal tem”.
COMBUSTÍVEIS – Para o governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas, a PEC é um bom instrumento, mas não encerra a discussão em si. Ele também alertou para o peso que a lavagem de dinheiro tem no fortalecimento das organizações criminosas e disse que é preciso um olhar atento para o setor de combustíveis.
“Talvez a gente pudesse dar, a partir dessa reunião, o primeiro grande passo para estabelecer um grupo de trabalho e formular uma série de propostas em complemento e que podem nos ajudar”, propôs Tarcísio. “Uma coisa que nos preocupa muito é a transposição do ilícito nos negócios lícitos e isso vai drenando a competitividade. Nós temos um problema sério com o setor de combustíveis. É muito fácil se obter um regime especial tributário no setor de combustíveis. E normalmente esses regimes especiais são para empresas de fachada, que operam na ilegalidade, e vão servir ao tráfico de drogas, vão servir ao crime organizado. É fundamental para que a gente possa fazer esse combate. E olhar o setor de combustíveis é um primeiro grande passo para a gente começar a cortar o financiamento do crime organizado”, alertou o governador.
AMPLO DEBATE – O encontro reuniu 16 governadores e governadoras, três vice-governadores e uma governadora em exercício. Além de Rui Costa e Ricardo Lewandowski, a reunião contou com a presença do vice-presidente e ministro do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços, Geraldo Alckmin; e dos ministros Esther Dweck (Gestão e Inovação em Serviços Públicos), Alexandre Padilha (Secretaria de Relações Institucionais), Jorge Messias (Advogado-Geral da União) e Vinicius Carvalho (Controladoria-Geral da União).
Estiveram presentes, ainda, o ministro Flávio Dino, do STF; o ministro Antonio Herman Benjamin, presidente do Superior Tribunal de Justiça (STJ); Andrei Rodrigues, diretor-geral da Polícia Federal (PF); Antônio Oliveira, diretor-geral da Polícia Rodoviária Federal (PRF); além de parlamentares e representantes da Frente Nacional de Prefeitos e da Associação Brasileira dos Municípios.
POLÍCIA OSTENSIVA FEDERAL – Segundo o ministro da Justiça, a PEC propõe, entre seus pontos, uma mudança de nome para a Polícia Rodoviária Federal, ampliando seu campo de atuação. “Passaria a chamar-se Polícia Ostensiva Federal, que, além das rodovias, atuaria nas hidrovias e ferrovias”, explicou Ricardo Lewandowski.
“A Polícia Ostensiva Federal poderá exercer o policiamento ostensivo na proteção de bens, serviços e instalações federais. Se nós tivéssemos, no dia 8 de janeiro de 2022, uma Polícia Ostensiva Federal aqui, não teriam ocorrido as invasões das sedes dos Três Poderes. Porque nós dependemos da Polícia Militar do Distrito Federal”, ressaltou o ministro da Justiça.
TRIPÉ – A PEC da Segurança Pública está baseada um tripé de ações para combater a criminalidade no país: adotar, na Constituição, o Fundo Nacional de Segurança Pública e a Política Penitenciária; atualizar as competências da Polícia Federal (PF) e da Polícia Rodoviária Federal (PRF); e constitucionalizar o Fundo Nacional de Segurança Pública e Política Penitenciária.
A PROPOSTA – A Constituição Federal determina, em seu artigo 144, que a segurança pública é dever do Estado, direito e responsabilidade de todos. O texto de 1988, no entanto, precisa ser aprimorado quanto às competências da União. A proposta prevê maior integração entre a União e os entes federados na elaboração e execução da política de segurança pública. Para isso, a ideia é colocar na Constituição Federal o Conselho Nacional de Segurança Pública e Defesa Social, composto por representantes do Governo Federal, dos Estados, do Distrito Federal e dos municípios. O principal objetivo, a partir dessas medidas, é estabelecer diretrizes para fortalecer o Estado no combate ao crime organizado, por meio da padronização de protocolos, informações e dados estatísticos.
SIMETRIA DAS FORÇAS – Os estados da Federação e o Distrito Federal atuam na área de segurança pública por meio de duas forças policiais distintas: polícia judiciária e polícia ostensiva. Na avaliação do Governo Federal, este modelo, considerado efetivo, merece ser replicado no âmbito federal. Desta forma, a PEC atualiza a competência da Polícia Federal de modo a garantir que ela atue em ações de crimes ambientais e aja contra práticas cometidas por organizações criminosas e milícias privadas que tenham repercussão interestadual ou internacional e exijam repressão uniforme. Ao contrário dos Estados e do Distrito Federal, a União não dispõe de uma polícia ostensiva. A Polícia Rodoviária Federal teria essa atribuição, fazendo policiamento em rodovias, além de ferrovias e hidrovias federais. Pela proposta, ela também prestará auxílio às forças de segurança dos demais entes federados quando requisitado.
PADRONIZAÇÃO – Atualmente, o Brasil possui 27 certidões de antecedentes criminais distintas, 27 possibilidades de boletins de ocorrências, 27 formatos de mandados de prisão e 27 carteiras de identidade estaduais. Para o Governo Federal, a padronização de dados e informações é fundamental para que se dê efetividade ao Sistema Único de Segurança Pública. Essa normatização não quer dizer que a União centralizará os sistemas de tecnologia de informação. Ou seja: os estados não serão obrigados a usar plataformas distintas das que já são utilizadas. Também não haverá qualquer ingerência nos comandos das polícias estaduais e tampouco a PEC modificará a atual competência dos estados e municípios na gestão da segurança pública. Outro ponto importante é que a proposta não prevê a criação de novos cargos públicos. A PEC tem como referência o Sistema Único de Saúde e o Sistema Nacional de Educação, ambos já abordados na Constituição.
ATRIBUIÇÕES – A proposta apresenta novas atribuições às policiais judiciária e ostensiva. Ao policiamento judiciário caberá atuar em ações de crimes ambientais e agir contra práticas cometidas por organizações criminosas e milícias privadas que tenham repercussão interestadual ou internacional e exijam repressão uniforme. Já no campo ostensivo ficará a responsabilidade de realizar o policiamento em rodovias, ferrovias e hidrovias federais e de prestar auxílio às forças de segurança dos demais entes federados quando requisitado.
ARTIGOS – A PEC da Segurança Pública propõe alterações nos arts. 21, 22, 23, 24 e 144, da Constituição Federal, de modo a conferir à União a competência para estabelecer diretrizes gerais quanto à política de segurança pública e defesa social, que compreenderá o sistema penitenciário; atualizar as competências da Polícia Federal (PF) e da Polícia Rodoviária Federal (PRF); e constitucionalizar o Fundo Nacional de Segurança Pública e Política Penitenciária.
Do Site do Planalto
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