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No momento em que o enfrentamento às mudanças climáticas ganha espaço nas agendas globais, uma inovação brasileira promete transformar a forma como se calcula o carbono armazenado nos solos. Pesquisadores da Embrapa Instrumentação (SP) desenvolveram um método que utiliza laser e inteligência artificial para estimar, em uma única análise, a densidade do solo e o teor de carbono. Simplificar a solução de processos tradicionais demorados, reduzir custos e pode acelerar iniciativas ligadas aos mercados de créditos de carbono.
Combinando técnica fotônica e modelo de aprendizado de máquina, o método estima com rapidez e eficiência a densidade aparente do solo e o teor de carbono. A solução adequada é para aplicações de campo em larga escala, como na agricultura de precisão e monitoramento ambiental. A técnica é baseada na espectroscopia de emissão por plasma induzido por laser (LIBS, na sigla em inglês), e substitui, em uma única análise, isoladamente de densidade aparente e a concentração de carbono.
Foto: Embrapa (coleta de amostras indeformadas, utilizando anel volumétrico para determinação da densidade do solo)
Para superar os desafios de métodos tradicionais, como o anel volumétrico, que requer amostras não perturbadas ou indeformadas (f oto acima) e exigir etapas longas de coleta e preparo ( veja quadro abaixo ), o pesquisador Paulino Ribeiro Villas-Boas , em coautoria com Ladislau Martin Neto e Débora Milori , desenvolveu um modelo baseado em LIBS para estimativa eficiente e econômica da densidade aparente e do estoque de carbono no solo.
O método já está com pedido de patente depositado no Instituto Nacional da Propriedade Industrial ( INPI ) e em processo de licenciamento junto ao setor privado. A solução tecnológica será apresentada no Simpósio Nacional de Instrumentação Agropecuária ( Siagro ), que será realizado de 14 a 16 de outubro, em São Carlos (SP).
"O método proposto emprega modelos de regressão de aprendizado de máquina calibrados com espectros LIBS de amostras de solo com densidade aparente e concentração de carbono conhecido. Treinamos e avaliamos o modelo usando um conjunto de 880 amostras diversas de solo brasileiro, divididas aleatoriamente em 70% para treinamento e 30% para teste", conta Villas-Boas.
As amostras foram coletadas em experimentos de campo de longa duração, em instituições de pesquisa, propriedades agrícolas e áreas de floresta nativa, com maior representatividade dos biomas Cerrado e Mata Atlântica. As coletas ocorreram em trincheiras de 0 a 100 cm de profundidade, para captar variações de matéria orgânica da superfície ao subsolo.
"O método desenvolvido estima não apenas a densidade aparente do solo, como também o teor de carbono, o que permite calcular o estoque de carbono com uma única análise feita por LIBS. Com a metodologia desenvolvida, o processo de coleta de amostras de solo é facilitado, pois podem ser coletadas amostras deformadas – que sofreram alterações em sua estrutura durante a coleta", relata o pesquisador.
Para Villas-Boas, os resultados do estudo ressaltam o potencial do LIBS para estimar múltiplas propriedades do solo simultaneamente, ampliando a sua utilidade na ciência do solo para além da composição elementar, ao incluir parâmetros físicos e químicos críticos, como a densidade aparente.
“A análise contribui para o manejo sustentável do solo e para a mitigação e adaptação às mudanças climáticas, além de iniciativas de monitoramento e mercados de créditos de carbono”, prevê o pesquisador.
A tecnologia pode ser usada por laboratórios de solos, produtores rurais, que se beneficiam do método, uma vez que ele viabilizará estimativas mais frequentes de estoques de carbono de suas propriedades agrícolas, além dos certificados de crédito de carbono que terão suas atividades e verificações facilitadas.
A espectroscopia de emissão com plasma induzido por laser (LIBS) é uma ferramenta rápida, versátil e eficaz na avaliação de amostras de solo, porque captura características essenciais associadas à densidade aparente e ao teor de carbono.
Milori esclarece que a técnica LIBS consiste em focalizar um pulso de laser de alta energia na superfície da amostra para gerar um microplasma (uma nuvem de átomos, íons e elétrons em alta temperatura). Esse plasma emite uma luz característica que funciona como uma “impressão digital” do material, uma vez que cada elemento químico (como carbono, ferro, cálcio) emite luz em comprimentos de onda específicos.
Segundo um pesquisador, outra vantagem importante é que a técnica requer um pré-tratamento mínimo da amostra, incluindo remoção de partículas maiores que grãos de areia (gravetos, fragmentos de raízes, folhas e pedras), além de secagem, homogeneização e peletização.
"O espectro LIBS de uma amostra de solo apresenta centenas de linhas de emissão correspondentes a elementos comuns do solo, como carbono, silício, alumínio, magnésio, ferro e cálcio. Essas características espectrais, que são influenciadas tanto pela composição elementar quanto pelas propriedades estruturais, desempenham um papel crucial na estimativa da densidade do solo", detalha Villas-Boas.
Villas-Boas acrescenta que variações na estrutura e na composição do solo se refletem nos espectros de LIBS, os quais, quando associados a modelos de aprendizagem de máquina, permitem estimar a densidade aparente do solo.
A densidade reflete a saúde do soloA densidade do solo é uma medida da massa seca de todo o material contido em determinado volume e inclui frações de origem mineral e orgânica do solo, normalmente difícil de medir com métodos convencionais. "É um indicador da estrutura do solo, reflete o grau de compactação e é crucial para cálculos precisos do estoque de carbono e de nutrientes. Contudo, a relação com o estoque por área não é direta: o estoque depende simultaneamente da concentração de carbono orgânico e da densidade do solo; além disso, solos com maior concentração de carbono orgânico têm a apresentar menor densidade e melhor agregação", explica Martin Neto. |
No entanto, os pesquisadores afirmaram que a técnica ainda é pouco explorada, o que representa uma oportunidade inovadora para melhoria em contextos agrícolas e ambientais, particularmente para otimizar a previsão do estoque de carbono no solo.
“Avanços em técnicas de fusão de sensores, pré-processamento e modelagem são cada vez mais cruciais para o monitoramento confiável do carbono do solo in situ”, conclui Villa-Boas.
O estudo “ LIBS for Rapid Soil Bulk Density and Carbon Stock Estimations: Toward Scalable Soil Carbon Monitoring recebeu apoio do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico ( CNPq ) e da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo ( Fapesp ) e foi publicado na Revista Europeia de Ciência do Solo (European Journal of Soil Science ).
Joana Silva (MTb 19.554/SP)
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