Desde o final do ano passado, o Centro de Referência de Atendimento à Mulher em Situação de Violência (CRAM) de Foz do Iguaçu conta com um espaço dedicado à leitura e à pesquisa. A Biblioteca do CRAM foi implantada a partir de duas iniciativas da UNILA – um projeto de intervenção do estágio de Serviço Social e o projeto de extensão Biblioteca Feminista. Atualmente, o local é frequentado por mulheres que procuram atendimento no órgão, mas também é aberto para a comunidade. E o objetivo é que a Biblioteca receba outras atividades, como debates, oficinas e rodas de leitura voltadas para temáticas feministas.
O acervo da Biblioteca é formado por livros de temas como história dos movimentos feministas, estudos de gênero, políticas públicas para mulheres, divisão do trabalho, além de literatura de ficção de autoria de escritoras. “Nosso desejo é que, com essa biblioteca, as mulheres que procuram o CRAM tenham acesso a informações de qualidade, que as ajudem a identificar possíveis relações abusivas e a saber quais são os seus direitos”, salientou a assistente social Sérgi Gondaski. A Biblioteca também recebeu uma doação de livros da Editora Cortez, com títulos sobre a formação e o papel dos profissionais de Serviço Social no atendimento a mulheres em situação de violência.
A principal responsável pela implantação da Biblioteca foi a discente de Serviço Social Márcia Alves de Souza, que realizou estágio no CRAM entre 2021 e 2022. “A equipe técnica do CRAM já tinha a ideia de fazer uma Biblioteca e, inclusive, já havia um pequeno acervo de livros no Centro. Por isso, apresentei a proposta de implantar a Biblioteca como projeto de intervenção do meu estágio”, contou. Márcia participou de todas as etapas de criação da biblioteca, desde a adequação do espaço físico, os orçamentos para compra de mobiliários, a busca por doação de livros e a organização do acervo.
A estudante também contou com o apoio do projeto de extensão Biblioteca Feminista da UNILA, encerrado em 2022, que tinha o objetivo de democratizar o acesso a obras e documentos relacionados com o feminismo, por meio de organização de coleções de referência e realização de debates. A iniciativa foi realizada em parceria com o projeto Biblioteca Feminista da Praia Vermelha, da UFRJ.
“Quando a estagiária iniciou suas atividades curriculares de estágio supervisionado em Serviço Social, buscou compreender a realidade do espaço sócio-ocupacional e se aproximar teoricamente da temática de gênero, por meio de leituras bibliográficas, em conjunto com o acompanhamento das intervenções profissionais. A ideia da implantação da Biblioteca partiu do diálogo e da troca de experiências com a equipe do CRAM”, explicou a professora Kátia Hale dos Santos, supervisora acadêmica do estágio e coordenadora do projeto Biblioteca Feminista da UNILA.
Com a Biblioteca já funcionando, agora a equipe do CRAM está em busca de parcerias para realizar atividades no espaço, como debates e rodas de leitura. “A Biblioteca do CRAM era um sonho antigo e, por meio do projeto da aluna Márcia Alves, se tornou uma realidade. Se tornou um espaço de acesso a livros de diversos conteúdos para as mulheres em situação de violência de Foz", disse a coordenadora do Centro, a psicóloga Kiara Heck.
Uma das justificativas para implantar uma biblioteca em um espaço que recebe mulheres em situação de vulnerabilidade é que a leitura e os livros podem desempenhar um papel significativo no enfrentamento da violência de gênero e na identificação de situações de abuso. De acordo com a professora Kátia Hale dos Santos, a literatura oferece um espaço seguro e uma fonte de conhecimento que pode capacitar as mulheres, proporcionando informações, apoio emocional e uma voz para suas experiências. “A tomada de consciência sobre as desigualdades produzidas historicamente pelo patriarcado se dá de diversas formas. A leitura é uma delas. Um texto que expressa casos particulares de violência e desigualdades sofridas acaba também expressando o universal. Às vezes, no seu cotidiano, a mulher acaba não refletindo sobre essas desigualdades, porque mulheres geralmente são educadas para reproduzirem a violência e a desigualdade. Nesse cenário, a leitura pode despertar essa consciência”, salienta.
Para a professora, uma das maiores perversidades do patriarcado reside na maneira como ele historicamente afastou as mulheres dos debates de questões universais – como política, economia e outros assuntos relevantes para a sociedade –, restringindo o universo feminino ao cuidado com a casa e a família. “Essa imposição foi, e ainda é, uma forma de negar às mulheres a participação plena nas esferas públicas. A transformação da sociedade se dá pela tomada de consciência da realidade em que vivemos. E esse é o ganho do projeto, da leitura, dos estudos e da própria oportunidade que a UNILA dá às mulheres latino-americanas de estudar esse campo”, complementou.
Após a implantação da Biblioteca, as estudantes, professoras e profissionais envolvidas no projeto receberam um outro convite: o de escrever um livro contando a experiência. O chamado veio da editora Cortez, uma das principais editoras da área de Serviço Social do Brasil. “Existe uma deficiência de publicações sobre a intervenção profissional junto às mulheres vítimas de violência. Então nos convidaram para escrever esse livro, que deve sair já no próximo ano e que tem potencial de se tornar uma obra de referência sobre essa temática no Brasil”, contou a docente Kátia Hale, professora visitante que já encerrou suas atividades na UNILA.
A publicação terá artigos escritos por integrantes da Universidade, do CRAM e do projeto Biblioteca Feminista da Praia Vermelha, da UFRJ, iniciativa parceira do projeto de extensão da UNILA.
O Centro de Referência de Atendimento à Mulher em Situação de Violência (CRAM) é um serviço de apoio, orientação e encaminhamentos para a garantia de direitos da mulher. O órgão conta com atendimento de serviço social, de apoio psicológico e de orientações jurídicas. “O principal objetivo é que a mulher vítima de violência receba as orientações necessárias e possa ser direcionada para a rede de atendimento para que seus direitos sejam garantidos, inclusive no que se refere à sua proteção e segurança”, explicou Sérgi Gondaski, que já atuou como assistente social no CRAM. No local, também são realizadas oficinas e rodas de conversa, abertas para todas as mulheres de Foz do Iguaçu.
O CRAM está localizado na rua Padre Bernardo Plate, 1250, e atende de segunda a sexta-feira, das 8h às 18h. O telefone de contato é 0800 643 8111.
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